segunda-feira, abril 06, 2009

Até um dia...

A noticia apareceu sobre a forma de telefonema...
A constipação tinha-me deixado preguiçoso e molenga e aproveitei para descansar...
Era de manhã...
O sol há muito tinha acordado... Ao longe um tiriri, que eu não discortinava, ia-me trazendo à realidade...
Procurava o tal tiriri, mas não o encontrava... de facto, é dificil encontrar um telefone verdadeiro num sonho...
Acordei...
Finalmente, percebi donde vinha o tal tiriri, e porque o não o encontrava! Vinha do escritório...
Atendi...
"Amor, tenho uma noticia triste..."
Percebi logo que algo de errado se passava, e o meu pensamento voou para perto da realidade.
"... tenho uma noticia triste... o teu pai ligou-me... tem calma... a tua avó morreu...!"
A minha avó morreu...!
Como?
"Estava sentada, ontem à noite, e caiu inanimada... Não foi possível fazer nada..."
Foi assim...
A minha bó Céu, foi ter com o meu bô Tónho!
... Ao Céu! Ao sítio onde os filhos de Deus se encontram....
O filme das nossas vidas correu rápido à minha frente...
Um filme da frente para trás... Compreensivel... Primeiro, aquilo mais fresco...
A última vez que estive com ela no lar e lhe pedi a receita do seu leite creme... Hum, que delicia era! Nunca mais comi leite creme igual... e isto não é um daqueles chavões que se costuma dizer. De verdade! Nunca mais comi um leite creme, tão bom como o da minha bó Céu!
"Avó, diz-me como fazias o teu leite creme."
"Então, pões o leite a ferver com o açucar, a farinha, juntas as gemas..."
E o meu pai lá ia ajudando nas quantidades... Quantas colheres de farinha? Quantos ovos?
Mas mesmo assim dito pela artista, o leite creme da avó, feito como ela dizia nunca será igual. Falta a lareira, as galinhas e, sobretudo, a minha avó!
A minha avó Céu, nestes últimos anos, já não "andava bem".
A partida, há 15 anos, do meu avô, abalou-a...
A senilidade, própria de uma senhora na casa dos 80, transformou-a numa pequena "troca-tintas" que por vezes, roçava as fronteiras do... indelicado...
Pouco depois do meu avô ter ido para o Céu, a minha avó veio viver para o nosso pequeno T2.
Foi pela Páscoa.
Quinta feira Santa.
Ela tinha ido com a minha mãe às cerimónias da tarde.
"Vai andando Mena, e ainda fico por cá...". Da Igreja do Carmo a minha casa, distam cinco espaços do ponteiro grande de um relógio.
Pelo sim pelo não, eu e a minha irmã, fomo buscá-la. Lá estava... Do lado esquerdo, sentada, num banco...
- Vó, vamos? São quase horas de jantar...
- Mais um bocadinho...
- Ok, enquanto espero vou ali confessar-me...
A conversa com o frei, foi, sem querer, demorada.
Noc, noc...
- Mano, demoras, a vó quer ir embora.
- Vou já...
Chegados ao sitio onde a minha irmã tinha deixado a avó, ela não estava.
- Já foi andando, vamos para casa.
- A avó já chegou? Ainda não, mas ela saiu antes de nós... vamos procurá-la...
Corremos a cidade...
S. Pedro, lembrou-se também de fazer das suas...
Corremos a cidade... eu de bicicleta, o meu pai de carro, tal como o Nuno e o Pedro (a quem entretanto pedi ajuda)... Nada.
Desaparecida!
- Vamos à Polícia
- Não vamos
- Aguardamos mais um pouco...
- Vamos!
A minha bicicleta voou...!
Acho que nunca pedalei com tanta velocidade, nem quando fui perseguido por aqueles 5 cães...!
Cheguei à PSP, muito antes daqueles que foram de carro!
- Vim participar o desaparecimento da minha avó...
- Onde foi, que idade tem?
Os formalismos estavam a ser cumpridos, quando ouço o carro do meu pai a chegar. A Avó tinha aparecido!
Ao pé das bombas da Repsol, junto à Universidade.
Num rebate de lucidez, entrou nas bombas e pediu ajuda!
Lembro-me perfeitamente da sua cara de menina traquina, que acabou de fazer uma asneira!
Lembro-me da sua cara assustada...
Foi um susto para todos... foram cerca de 3 horas de "à procura da avó desaparecida..."

A minha avó era uma mulher do campo, da terra...
Do cheiro a quintal, a lareira, às rosas perto da janela da cozinha, às laranjeiras ao pé do ribeiro...

Lembro-me de a ver, de manhã, no "telheiro", a pentear o seu longo cabelo louro acizentado que apanhava numa trança e enrolava no cimo da cabeça, e o quanto eu admirava o seu cuidado, frente ao pequeno espelho, baço e velho que estava preso num lavatório antigo...

"Ah desgraçado que já foste ao galinheiro espantar as galinhas do choco!"

"Deixa os gatos em paz...!!"

"Cuidado com o galo! Ele é mau!"

"Quem tirar a palhinha mais pequena paga a rodada no café...."

Ontem, na missa, ao seu lado, pensava nisto tudo...
A Avó foi para o Céu ter com o Avô...

E assim, enquanto eu me lembrar das coisas que ela foi, fez e significou para mim, a minha avó viverá, para sempre! No meu coração, no meu pensamento.
Em mim, e nos filhos que terei e a quem irei passar os seus genes!

Tão cedo, não me fará o tal leite creme, mas sempre poderei dizer: Não há leite creme como o da minha vó Céu...

Até um (bom) dia...

6 comentários:

Raquel MArtins disse...

mano.... não consigo dizer nada...

Filhipa disse...

Olá Pedro!
Quando entraste no MSN reparei no teu nick... muito parecido com o meu... Decidi espreitar o teu blog. Senti as tuas palavras como se fossem as minhas há um mês atrás, quando faleceu o meu avô Manel. Hoje, a dor começa a transformar-se em saudade. Ele faz-me falta... Mas como tu dizes: sei que foi ter com a minha avô e sei que estará feliz...
Um beijinho,
Pia

#SerMãeNoEstrangeiroEEmTempoDeCovid disse...

"..unidos pelo mesmo sol, SOMOS UM.."

PM disse...

Pia e Claudia, obrigado pelas vossas palavras...
Um beijinho com amizade

Poeta do Penedo disse...

tu, meu amigo, que estiveste comigo, num momento muito especial, dedicado precisamente ao meu avô Joaquim, és mais do que merecedor que da minha parte tenhas umas palavras de amizade, quando chegou a tua altura de veres partir um dos teu avós. São eles a nossa companhia muito meiga, que nos deixam sempre um legado muito rico...e muitas saudades para sempre.
Um abraço amigo Pedro.

PM disse...

Jorge
Obrigado pelas tuas palavras.
Apesar de algum afastamento (fisico), a presença dos amigos é uma certeza!
Um abraço